26 agosto 2008

Peso desnecessário

Você já tentou correr com uma pessoa nos braços? E nadar com alguém nas costas? Virar cambalhota com alguém nos ombros, já tentou? Difícil, não é mesmo? É provavelmente impossível fazer essas coisas com o peso de outra pessoa. Imagine agora com o peso de uma nação inteira!

Absurdo? Mas é o que costumamos fazer com nossos atletas (olímpicos ou não). Depositamos neles a esperança de uma vida toda, como se da vitória dele dependesse nossa vida quando, no fundo, nem a vida deles próprios depende daquela prova.

Sabe aquela história de “a pátria de chuteiras”? Só prejudica, seja a nação, seja o atleta. Colocamos nossas esperanças no desempenho de certo atleta como se a vitória dele fosse gerar empregos, diminuir a violência, baixar os altíssimos impostos. Como se, graças à vitória de certo atleta, pudéssemos comprar a feira do mês e, na saída, dizer ao caixa: “coloca na conta da medalha de ouro do fulano”.

É muita responsabilidade! O atleta sente. Muitas vezes nem a maioridade tem! Veja o caso da ginástica olímpica feminina: o Brasil torcia pela Daniele Hypólito até descobrir a Daiane dos Santos. Imediatamente ela virou o centro das atenções. O resultado? Na competição seguinte, um fiasco. Aí elegeram a Jade Barbosa como nova estrela. Gente, a Jade tem só 17 anos!!!! Não é peso demais? Responsabilidade demais? Como é que o corpo vai fazer todos os movimentos milimetricamente perfeitos se a mente, ao invés de se abstrair de tudo e se concentrar somente no movimento, está com algo a lhe tirar a calma?

Veja outro caso. O Rubens Barrichello nunca foi um excepcional piloto, mas era de médio pra bom. Com a morte do Senna em Ímola, Rubinho foi chamado a ser o herói brasileiro. Transformou-se em um piloto (mais) medíocre: todos os seus vice-campeonatos foram ganhos quando a Ferrari corria sozinha e as outras equipes se arrastavam. Mesmo assim, ele era incapaz de passar um carro em movimento e abria fácil pra quem pressionasse. Sem arrojo, sem determinação, sem personalidade. O piloto ideal de um ônibus escolar! E nem poderia ser diferente, já que conduzia toda uma numerosa nação no banco do passageiro. Não há o adesivo “bebê a bordo”? Com ele era “Brasil a bordo”.

Mas o prejuízo é ainda maior quando eles ganham! Com a vitória deles, nos sentimos potências mundiais! O Brasil ganhou dos Estados Unidos no arremesso de serpentina? Imediatamente nos sentimos o país mais poderoso do mundo de todos os tempos! Os impostos continuam sufocando a economia, a saúde pública piora dia a dia, o desemprego cresce, a corrupção corre solta mas nos sentimos melhores e adiamos a urgência das reformas e mudanças. O escândalo do Congresso ameaça respingar no Presidente e ele recebe o medalhista de ouro: adivinha qual das duas notícias receberá a manchete do outro dia e qual das duas será mais comentada...

Precisamos parar de colocar tanta responsabilidade nas costas de nossos atletas. E, por falar nisso, nas costas de qualquer um! Não são os meninos do vôlei, a Marta do futebol ou o Diego Hypólito que vão salvar o Brasil não! Nem vai ser o Lula, o FHC, o Collor ou o Sassá Mutema tampouco! Só você é capaz de melhorar nosso país. Cada um de nós...

As olimpíadas acabaram... Pro Brasil, sem muito brilho e sem muitas medalhas. E esse texto termina aqui também... Sem brilho e sem medalha. Como convém.

2 comentários:

Anônimo disse...

Excelente texto, Mr Miller,

É a velha mania de procurar um semi-deus um ser mítico, ungido de super-poderes.

E por que? Porque o povo brasileiro não tem uma cultura de prática desportiva. Pelo contrário, coloca todas as frustrações no esporte, já que é derrotado diuturnamente, em sua vida pessoal, profissional, cívica, etc.

Mídia e população que só querem medalhas, taças e troféus a qualquer custo não merecem ser levados em conta.

Lamento, mas falta foco e concentração aos atletas brasileiros, que muito levam em conta o que lhes dizem, sem pensar nos objetivos a serem alcançados.

Enfim, Pequim 2008 é história pra contar. Que venha Londres 2012.

Pelos caminhos da vida. disse...

Primeira visita!

Passei rápido por aqui, estou mexendo com mudanças, mas outra hora com mais tempo volto aqui,mesmo não tido tempo de ler tudo seus textos os poucos que consegui ler, gostei.
Um otimo fim de semana.

beijooo.