27 maio 2009

A Genealogia do Brasil, por Emplastro Cubas

Achei o texto a seguir no Emplastro Cubas. Recomendo a leitura principalmente do texto abaixo e de “A Fantástica História do País B.” – partes I e II. Mas não leia somente estes, pois o blog inteiro é muito bom!

A Genealogia do Brasil

Voltando na linha do tempo, sempre é possível buscar a gênese de uma nação em um evento histórico de grande importância. Este evento invariavelmente caracteriza-se por um momento de superação, o salto de uma fase menor para uma fase de grandeur. É uma oportunidade para a nação se livrar de resquícios indesejados do passado para entrar numa nova era. Os Estados Unidos nasceram da proclamação da independência e da subsequente sangrenta guerra contra a poderosa Inglaterra; esta surgiu de fato na Revolução Gloriosa de 1666, a primeira revolução burguesa da História. Do outro lado da Mancha, a República Francesa foi fundada na Revolução Francesa, mas já é possível traçar sua concepção desde Carlos Magno. A Confederação Helvética teria surgido na revolução inflamada por William Tell; A Argentina teve San Martin, e, nessa lógica, é possível mencionar mais dezenas de países.

O Brasil é um caso a parte. O Descobrimento do Brasil em 1500 não é sua gênese; passaram-se 30 anos até que alguém deu alguma atenção ao lugar. O verdadeiro evento que levou a criação da nação brasileira é a Fuga da Família Real. A Independência não mudou nada, ao contrário da Fuga da Família Real, que obrigou os portugueses a vir para cá, na marra. Não fosse a chegada de Dom João em terras tupiniquins, não haveria a Independência mais fácil da História, 14 anos depois, nem as principais estruturas que originaram nosso país. A propósito, quando da sua independência, o Brasil foi o único país americano a tornar-se monarquia, e tanto no surgimento da Independência quanto no da República foi disparado um tiro sequer. Foram ambos eventos de coaptação, de criação de cargos públicos, de manutenção em forma de mudança. Aparentemente, em 1822 já existiam partidários do PMDB.

Enquanto a genealogia das nações é feita de lendas, atos heróicos, tratados diplomáticos, sublevação dos oprimidos, guerras internas, externas, partidárias e religiosas, a do Brasil pode ser resumida num ato, o da fuga – que não é a coisa mais dignificante a se fazer. Lembro de uma professora de História, ainda no colégio, orgulhosamente contando como nós, brasileiros (esqueceu-se ela que Dom João era português) havíamos habilmente conseguido enganar Napoleão ao fugir das tropas francesas. Como se correr apavorado como se não houvesse amanhã, deixando tudo para trás, fosse enganar alguém. Quem não podia pagar a viagem, ficou. Vieram só os cooptados pelo sistema português. Que belo método de seleção natural ao inverso criou Napoleão, inadvertidamente.

A lista de países e reinos que se engajaram militarmente contra le petit corporal apenas deixa essa façanha lusitana ainda mais humilhante: Espanha, Inglaterra, Itália, Sicília, Áustria, Rússia, Prússia, Saxônia, Reino Unido da Holanda, Piemonte e Hanover, para não mencionar a poderosíssima Brunswick, que se eu tivesse encontrado no google, saberia que tem um povo tão feroz que fez Napoleão dormir na pia, ou pelo menos é isso que gosto de pensar. A Suécia abandonou a neutralidade e mandou vir. Até o Vaticano lutou contra a França napoleônica, e isso deve ter sido engraçado.

Foi esse pessoal valente e cheio de vontade de vencer que aportou no Rio de Janeiro para fundar a nação brasileira. Então não sejamos muito exigentes com nossos políticos, pessoal. Não dá para esperar grande coisa.
Achei interessante a professora contar a fuga como vantagem. Eu também já passei por isso. Os professores contavam a história do Brasil cheios de ufanismo e eu me envergonhava dela (salvo em raríssimos momentos).

Sempre achei a nossa história meio “banana”, apalermada, bocó: desde a descoberta “por acaso” (para evitar calmarias na costa africana? Faça-me o favor!) até os dias de hoje, a história do Brasil é uma grande mentira. Você duvida? Oficialmente, fomos descobertos por “barbeiragem” de quem se desvia um oceano inteiro, nossa independência foi proclamada pelo príncipe herdeiro da metrópole e nossa república, pelo guarda-costas da família real. Os exemplos se seguem até chegar aos dias de hoje, ao PT, ao Lula, aos partidos de oposição que a nada se opõem... Resumindo, tudo neste país é um faz de conta para iludir o povo.

Muitas vezes o teatro é tão mal feito que dá pra perceber a falsidade, mas “ai, que preguiça!”, como diz Macunaíma. E deixa assim mesmo. Nunca tivemos essa gênese que nos desse o sentimento de ser nação: ou a gênese foi a fuga, que não nos faz nação de verdade, ou a gênese não houve e ainda está no futuro. E, sem esse sentimento de sermos o mesmo povo, vamos tentando viver, uns mamando nas tetas dos bancos estatais, outros nos bolsas-mizérias e no meio disso a classe média ocupada demais na sua vida pra fazer alguma diferença, todos apaticamente esperando o dia em que poderemos fugir de volta. Continuamos esperando as caravelas. Não nos sentimos parte deste país, nos dividimos entre exploradores e expectadores. Uns roubam e outros assistem.

PS: Quando falo em nacionalismo, não falo naquele usado como refúgio de canalhas, no nacionalismo que tenta justificar a xenofobia, nem naquele apelidado de soberania nacional em nome da qual os governantes abraçam terroristas e dão pitaco na justiça de outros países. Eu me refiro ao sentimento de pertencer a uma terra e a um povo.

23 maio 2009

Educação infantil e (falta de) caráter do brasileiro

Quando vejo uma criança querendo fazer algo que não pode, quase sempre o adulto que o acompanha se sai com uma destas frases:
_ Não faz que o homem briga!
_ Se fizer, vai ficar doente!
_ Faça e eu te boto de castigo!

Fico me perguntando onde foram parar (se é que já existiram) o “porque não pode” e o “porque é errado”. Fiquei pensando nesse traço da educação infantil e na forma como ele se manifesta no adulto (e como isso ajuda a explicar o Brasil).

Aprendemos desde criança que algo pode ser feito, seja certo ou errado, desde que
  • Nenhum policial, fiscal ou outra autoridade esteja presente (o “homem que briga” não esteja por perto);
  • Não traga prejuízos a si (não “fique doente”); e
  • Haja uma forma de evitar a punição, por influência, propina ou recursos judiciais (escapando do “castigo”).

Não sei como é que as mães americanas, européias e japonesas educam os filhos. Nem tampouco como é no Haiti, Senegal e Congo. (A ajuda de leitores seria bem vinda). Talvez em alguns países as mães dêem as mesmas desculpas e prometam o mesmo castigo, mas quando ficam mais velhos, os filhos recebam a noção de certo e errado. Pode ser que em outros países as mães ensinem desde cedo que não se deve fazer porque é errado, pura e simplesmente. Mesmo que não haja homem pra brigar ou risco de adoecer. E com castigo se fizer, não como ameaça (geralmente não cumprida), mas como corretivo.

Também não quero ensinar como educar os filhos. Cada qual que cuide dos seus. Me preocupo é com essas crianças crescidas sem valores, pessoas que passam no vermelho quando não tem foto-sensor, que estacionam em local proibido quando não tem guarda, que pagam propina ao fiscal pra liberar a mercadoria, que viajam com a família às custas do contribuinte porque não era proibido (e precisa proibir o imoral?), que pintam e bordam porque o irmão é amigo do presidente e depois manda arquivar, etc.

O fato de não ser punida não torna a transgressão um acerto, não ser pego não moraliza a imoralidade, ninguém ver o crime que você fez não te torna honesto. O Direito - e a condenação, prisão, multa, etc. - não é a única forma de julgamento. Antes dele há o caráter, a moral, a ética, os costumes, os preceitos religiosos e a desaprovação social. Infelizmente todos estes são fracos no Brasil.

Depois de muito me perguntar quando foi que o brasileiro perdeu as noções de caráter, começo a perceber que ele talvez nunca as tenha desenvolvido.

20 maio 2009

Epifania

Ontem saí com um grupo de amigos e foi muito divertido. A grande e grata surpresa foi a presença de um grande amigo nosso que passou por maus bocados ano passado, inclusive com início de depressão. Ontem se mostrou outra pessoa.

Não estava somente melhor do que antes da depressão, mas melhor do que quando o conheci. Era outra pessoa! Muito mais seguro de si, demonstrando isso pela conversa e nos relatos de atitudes no novo emprego e no novo namoro.

Quando comentaram que ele parecia bem melhor, ele afirmou que realmente se achava mais maduro. Aí alguém na roda comentou: “Graças à Fulana!”. A Fulana, no caso, era a ex-esposa.

Graças à ela? Como assim? Ela não conversou com ele. Ela não o levou ao médico. Não o apoiou. Não fez nada para ajudar. Simplesmente o abandonou (da pior forma possível) assim que a dificuldade bateu.

(Quando ele perdeu o emprego, ela começou a tratá-lo como incapaz e incompetente. Pra piorar, um acidente de carro o deixou de cama por duas semanas e neste período ela foi vista saindo com um “amigo”. Ou dois.)

A desilusão amorosa e a dificuldade financeira causaram o início de depressão e a busca por ajuda com amigos, às vezes na religião e até na bebida. No meio de alguma conversa, oração ou porre ele teve uma epifania, um insight e pode ver tudo claramente (como Neo vendo as letrinhas escorrendo, no final do primeiro Matrix).

De quem é o mérito? Dela? Isso seria supor que ela o teria humilhado, abandonado e traído para lhe dar um “tratamento de choque”, o que não é verdade. A intenção jamais foi essa.

Sabendo o que ele havia passado, tive vontade de dizer “graças a ela o #$%¨*&*#!”, mas ele, mais educado, sorriu e disse apenas:

_ Quer dizer que graças a Hitler, temos Guernica? - e mudou de assunto.