você mudou. Mudou tanto e tão rapidamente que duvida
da própria mudança e sinceramente acredita que foi sempre assim.
Você era calma e carinhosa, estava feliz com o
que tinha e espalhava felicidade, mas bastou um dia em outra cidade para um
treinamento admissional – não sei se foi o novo emprego, um colega de trabalho ou
uma palestra “motivacional” (sei bem o que muitas querem nos motivar a fazer) –
e naquela noite você já era diferente. Tornara-se ambiciosa e materialista.
Nada mais satisfazia você, Lysia. Todos os
lugares a que costumava ir eram agora medíocres na sua nova ótica. Porém, como
poderia frequentar lugares chiques sem dinheiro? Você passou a persegui-lo e a
medir sua felicidade pelos números no contracheque. O que antes gostava de
fazer se tornou um fardo. Tornou-se inconcebível pra você que seja possível ser
feliz com metade do que ganha hoje, ou mesmo de graça. Mas é!
Durante um bom tempo esperei ao seu lado que
voltasse a ser a pessoa amável de antes, mas era inútil, você havia trocado sua
inocência pelo brilho falso das bijuterias trazidas pelo colonizador. Como
diz a música “Índios”, do Legião Urbana, “nos deram espelhos e vimos um mundo
doente”. A saudável menina de antes era agora uma mulher amarga, materialista e
frustrada.
Lamento muito sua escolha. A busca por riquezas
nunca é satisfeita, sempre se pode querer mais, (pois os números são infinitos
e sempre haverá um maior do que se tem). “Quem ama o dinheiro, dele não se
fartará; quem ama a riqueza, dela não tirará proveito: e isso também é vaidade.”
(Eclesiastes 5,9) Sempre se quer mais, de fato. Há uma permanente insatisfação
e para preencher este vazio passamos por cima de tudo o que antes nos
importava. Ou de todos.
E eu estava no caminho. Demorei mais de dois
anos pra perceber sua mudança e aceitar que ela é irreversível. De príncipe
amado fui passando cada dia mais a ser o atalho para sua vida mais fácil: o
motorista que ia buscar, o telefonista que avisava tua mãe, o cartão de crédito
pro tratamento capilar.
Depois o carinho rareou e acabou. Por fim
foi-se a consideração. No aniversário de namoro, o que me deste? Tão somente a
não-explicação pela ausência. No teu sentir, para que se justificar a um
funcionário? Era somente isto o que eu me tornara pra você.
Sei que tentará se justificar afirmando que me
dava atenção, que me visitou quando estive hospitalizado, me deu presentes e
que me ligava todos os dias. De fato você fez tudo isto, mas sem amor, somente por
dever e gratidão a alguém que fazia muito por você. Mas não era amor, tanto é
verdade que não havia beijo ou abraço, não havia “sinto saudades” ou “te amo”
(exceto o burocrático no fim do telefonema, quando havia), não havia sorriso no
encontro.
Tenho pena de você, pois era feliz quando lhe
conheci, mas trocou seus princípios pela ambição desmedida. Se me permite ainda
te dar um conselho, darei pela consideração que ainda sinto pela mulher que não
mais existe: vá em frente! Não seja covarde, não receie ousar, persiga este
ouro de tolo (todos os ouros são de tolo, afinal) até perceber que não vale a pena,
após muito sofrimento e tempo de vida desperdiçados.
Boa sorte! Você vai precisar...
2 comentários:
Honesto e sincero desabafo do bom e velho amigo Scotch. Irretocável, por sinal.
Espero vê-lo em breve, com saúde e disposição para nossas longas discussões literárias, filosóficas e musicais.
Forte abraço!
Há uma frase que talvez explique o que aconteceu com Lysia:
"O fracasso lhe subiu a cabeça." (Millôr Fernandes)
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